Recentemente foi anulada condenação da Apple, de indenização em patente de propriedade da empresa Personalized Media Communications LLC, sofrida por decisão de um júri, evitando o pagamento de 308 milhões de dólares norte-americanos.
ENTENDA MELHOR O CASO
Em março do corrente ano um júri ligado ao Tribunal Distrital do Texas, subdistrito de Sherman, condenou a Apple por suposta violação de patente da empresa Personalized Media Communications – PMC LLC. Segundo a requerente PMC LLC, a violação teria ocorrido através do software de Apple, denominado Fair Play, o qual é utilizado na App Store, I-Tunes e Apple Music.

corte distrital do texas sherman (Foto CISS ge)
Tratava-se da patente n. 8,191,091. No primeiro grau houve a tentativa de Apple de anular a patente, alegando inexistência de ato inventivo. A “maçã”, através de seus advogados, hostilizou as quatro reivindicações principais. E ainda tentou trazer para o bojo da discussão mais três patentes, que segundo a defesa dela estariam vinculadas.
E requereu o julgamento sumário de nulidade da patente de final “091”. Tais pedidos (de nulidade da 091 e inserção das outras três neste contexto litigioso) foi negado e arquivado, sob decisão do Juiz ROY S. PAYNE.
Depois, diante da validade da patente, o litígio prosseguiu com juri do mesmo tribunal, ocorrendo a condenação da Apple, em março de 2021.
A decisão de março foi proferida por um Juri do citado tribunal, que após apreciar a patente deferida pelo USPTO (o “INPI norte-americano”), compreendeu que tecnicamente o software de Apple efetivamente continha mecanismos da patente de PMC.
Em razão disso e após a condenação, entretanto, APPLE recorreu e houve reapreciação do caso, sendo proferida nova decisão, de relatoria do Juiz Rodney Gilstrap, da Corte Distrital do Texas, de Sherman.
O Magistrado, valendo-se de decisão proferida em outro tribunal de patente, declarou que a patente não poderia ser fundamento da indenização, em razão de que a mesma estava maculada por abuso de direitos de patentes. Com isso, foi possível ser anulada decisão condenatória da Apple em patente, livrando a gigante de Cupertino de arcar com a vultosa soma de 308 milhões de dólares em pagamentos de royalties à titular.
Nesse contexto, o abuso consistiria no fato de que PMC teria intencionalmente atrasado a formulação de pedido de patente perante o USPTO (INPI norte-americano). Segundo consta no julgado, haveria indícios de que a empresa estaria a praticar tal expediente visando obter um cenário de muitas “infrações”, para poder depois “cobrar a conta”.
Além da Apple, tida como alvo em documento interno obtido pela defesa, outras empresas também estavam listadas, como Intel, IBM, Microsoft e Netflix. O Google foi inocentado, em caso envolvendo a PMC, relativamente ao seu “Alphabetics”.

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A CITADA PATENTE E A CRONOLOGIA LEGAL
A patente em questão diz respeito à tecnologia de gerenciamento de dados criptografados, que remonta ao ano de 1981 e que na verdade já deveria ter sido objeto de patente concedida naquela distante década. Essa realidade parece chocar-se com os requisitos legais no mundo para concessão de patentes, que são a novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.
Assim, apesar do contexto legal acima citado, que é o atual, o caso somente foi possível ser formulado como ação judicial porque a patente que surgiu de base para ação foi obtida através de documentos contemporâneos à época em que uma patente era válida por 17 anos nos Estados Unidos. E isso ocorria independentemente de quanto tempo demorasse para que a mesma fosse concedida. E aqui estava, aparentemente, o expediente.
Com efeito, o processo desta patente teria sido “atrasado” por PMC através de requerimentos administrativos. Até que o uso de seu objeto estivesse sendo usado em larga escala pelas gigantes de tecnologia.
Para ser anulada condenação da apple em patentes, os advogados desta centraram a defesa na nulidade da patente. Esse objetivo de impedir a exeqibilidade dos efeitos da patente em questão focaram não-somente a fato de ser obsoleta a tecnologia, mas sobretudo fatos processuais, onde restou visível que a titular parece ter atrasado propositalmente o andamento do feito administrativo.
TECNOLOGIAS ANTIGAS
Parte da defesa da Apple atacava justamente o tipo de patente que foi deferida: uma patente-submarina, com tecnologia que no dizer dela, era antiga e já deveria pertencer ao estado da técnica. Sistema há muito usados. Porém, que eram silenciosamente objeto de patente. No caso, a patente de final “091”, da PMC.
Por isso, a Apple lembrou a questão do padrão de atuação negocial da titular ou queixosa, a PMC, de nada produzir e ser mera licenciadora.
Na verdade, o que se percebe de vários artigos de imprensa norte-americana., é que a PMC seria tida como uma empresa puramente licenciadora de patentes, como um troll de patentes, fundada por John Harvey e um engenheiro elétrico chamado Jim Cuddihy, que produziram invenções no início de 1981.
Em defesa de tais alegações, o advogado de PMC, Arun Subramanian, efetuou longo histórico sobre o o surgimento da PMC e afirmou que tais invenções estariam muito a frente de seu tempo e diriam respeito basicamente à televisões e transmissões de mídia. Mas que deveriam ser protegidas na forma da lei por patentes.

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Entretanto, segundo o advogado do Google, Charles Verhoeven, sobre a PMC, o modelo de negócios da PMC seria questionável: “eles são uma empresa de licenciamento. Eles não fazem nenhum produto comercial. Eles não vendem nenhum serviço comercial.” O procurador afirmou que as invenções que estão sendo objeto de ações da PMC são de 1981, e uma outra teria surgido em 1987. Tudo isso cerca de 25 anos antes do Google comprar o Youtbe (que foi o acusado de usar uma das patentes da PMC).
Nada obstante litígios como narrado aqui, que arranham a propriedade intelectual aos olhos de muitos, o bem estar das pessoas está intimamente vinculado às melhorias de tecnologias que facilitam a vida da população, em diversas aplicações diárias. E isso demonstra que a propriedade intelectual é um viés irreversível para o desenvolvimento do mundo e de nossa espécie.

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Na verdade, a PMC protocolou centenas de pedidos de patente antes da virada do século, porém, a grande maioria não havia sido arquivada até 2010, tendo sido concedidas 110 patentes. No site da PMC consta extensa lista da patentes e vários licenciados.
A patente em questão é classificada pelos especialistas como “patente submarina”, que é o tipo de patente que surgia sem aviso no mercado, já que ninguém teria como ter conhecimento de seu assunto.

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Esse termo surgiu no cenário de patentes norte-americano, onde antigamente a publicação da patente (que acontece hoje no Brasil para tornar público o pedido de patente) ocorria concomitantemente com a concessão da patente.
Outra característica deste tipo de patente, é que a mesma geralmente dizia respeito à tecnologias antigas, que acabam tendo sua proteção postergadas por anos, através de inúmeras discussões e juntadas de documentos adicionais, fatos processuais administrativos que tinham efeitos (e pelo visto, era esse o objetivo) cuja conveniência parece extrapolar o objetivo legal das patentes.
Este modus operandi possibilitava manter o conteúdo da patente em segredo, o que permitia que o mercado acabasse sendo populado por usuários, para depois, abruptamente, surgir a concessão da patente, atigindo em cheio e de surpresa, gigantes do setor tecnológico. Tal qual um submarino aflora repentinamente na superfície de um mar. No caso, o mar do mercado tecnológico. E isso sempre foi mal visto no cenário de P.I. americano, principalmente pelo USPTO.
Aliás, foi justamente Joseph Matal, um ex-funcionário de alto cargo do USPTO, atualmente no escritório de advocacia Haynes and Boone, que afirmou ser “ridículo o sistema permitir esse tipo de coisa. Tudo isso deveria estar em domínio público há duas décadas.”
Neste contexto o dseenvolvimento das defesas de Apple não tiveram maiores dificuldades. Quanto à esta, os advogados da maçã buscaram uma série de documentos da própria PMC, visando demonstrar não-somente que a tecnologia em questão era ultrapassada, mas sobretudo que existiam planos internos de atuar fortemente contra as possíveis “destinatárias naturais” de tais ações judiciais.
A propósito, tais esforços visavam justamente chegar a uma situação de que fosse anulada condenação da apple em patente, livrando-a de um pagamento tido por ilegal e injusto pelos patronos da maçã. Hoje se sabe que a tecnologia existente é muito mais avançada do que a existente na década de oitenta, quando sequer havia internet para o público.
Nada obstante existam tecnologias antigas, adaptadas para a modernidade, que são assuntos similares a commodities.

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Na verdade, aparentemente a empresa estava apenas seguindo a lei, por caminhos que acabavam permitindo os efeitos acima citados. Em razão de casos similares, em 1995 a lei de patentes mudou nos Estados Unidos, limitando-se a proteção de patentes em 20 anos, a contar da data do pedido.

(foto CISS ge)
Com isso o USPTO passou a usar outros procedimentos e prazos para processos de patentes, o que esvaziou a qualidade de submarinas, deste tipo de patentes. Com a recente decisão do Juiz Gilstrap, a situação é de que presentemente foi anulada condenação da apple em patentes, livrando-a, pelo menos momentaneamente, de pagar 308 milhões de dólares. A PMC afirmou que irá recorrer para o respectivo tribunal federal.
LINKS EXTERNOS:
Personalized Media Communications LLC
United States District Court of Texas
LINKS INTERNOS:
O que é um certificado de patente?
Autor: Carlos Ignacio Schmitt Sant´Anna – ©